H.MATISSE/M.CHEKHOV (Parte 2 de 3)

L’EXACTITUDE N’EST PAS LA VÉRITÉ
A semana em que levei Michael Chekhov para visitar Henri Matisse
PARTE 2 de 3 (continuação de Parte 1)

Uma coisa que Matisse e Chekhov tiveram em comum era que, ao se estudarem com muita coragem e honestidade, cada um descobriu que, para o processo criativo poder acontecer, o artista precisa permitir que algo do mundo externo o transforme no seu interior. Pode ser um objeto, uma pessoa, uma paisagem, uma imagem, uma atmosfera. E é essencialmente esta experiência de transformação que expressamos enquanto artistas. Tem uma frase maravilhosa do Goethe que descreve isto perfeitamente, “Cada novo objeto, bem contemplado, abre um novo órgão dentro de mim.”

Ou, nas palavras do Matisse: “Criar é expressar o que temos dentro de nós. Todo esforço autêntico de criação é interior. Então precisamos alimentar nosso sentimento, e isso é feito com ajuda de elementos que tiramos do mundo exterior. É aqui que entra o trabalho através do qual o artista incorpora, assimila aos poucos o mundo exterior, até que o objeto que ele desenha se torne uma parte dele mesmo, até que ele o tenha dentro de si e possa projetá-lo na tela como sua própria criação..”[1]

E: “Não é uma mais uma questão de trazer as lembranças do mar, do campo etc. É necessário fazer uma construção. É a vibração do indivíduo que importa, em vez do objeto que produziu esta emoção. Não transmitimos a matéria, mas a emoção humana, uma certa elevação do espírito que pode provir de qualquer visão.”[2]

Esta transformação depende de um certo tipo de concentração, um tema que Michael Chekhov desenvolveu em uma série de exercícios que usamos bastante no estúdio, desde as primeiras oficinas introdutórias. Neles o aluno passa tempo com objetos cotidianos e de uma certa forma penetra a verdade da sua forma, tamanho, cor e outras características físicas. Inicialmente, alguns tendem a trabalhar com associações pessoais ou formam conexões emocionais com os objetos, ao invés de simplesmente estarem com o objeto no tempo/espaço, mas assim que encontram a atividade certa, são capazes de, por assim dizer, penetrar de uma forma espiritual e acordar em si uma conexão realmente criativa com o mundo em volta.

“O estudo profundo permite que meu espírito tome posse do sujeito da minha contemplação, e eu me identifico com ele na execução definitiva da minha tela.”[3]

Os alunos começam a ser capazes de sustentar uma conexão com objetos mesmo quando não estão diante deles. Sentem que continuam “com” eles e podem completar outras tarefas, como se os objetos fossem agora imagens os “segurando” de alguma forma. Isto traz um poderoso senso de força, expansão interior e desenvoltura. Em pouco tempo, conseguem fazer isto com objetos lembrados e imagens do vasto cosmos da imaginação. Como é o objeto da concentração que segura o artista, e não vice versa, não há labuta e ficamos livres para expressar esta experiência.

“Quando desenho, eu naturalmente tento esvaziar completamente o cérebro de toda memória, para receber somente o momento presente. Então surge um vazio – e eu sou apenas o espectador do que faço.”[4]

E: “A partir de um certo momento acontece uma espécie de revelação, não sou mais eu. Neste momentos existe uma verdadeira divisão ocorre dentro de mim: não sei mais o que faço, eu me identifico com meu modelo.”[5]

(lê a continuação Parte 3)

(c) 2017 Hugo Moss
Todos os direitos reservados

[1] Citado em Couturier, Marie-Alain. Se garder libre (Journal 1947-1954. Paris, Éditions du Cerf, 1962

[2] Citado em Couturier, Marie-Alain. Se garder libre (Journal 1947-1954. Paris, Éditions du Cerf, 1962

[3] Citado em “Entretien avec Tériade”, L’Intransigeant, 19th, 20th and 27th October 1930

[4] Citado em Couturier, Marie-Alain. Se garder libre (Journal 1947-1954. Paris, Éditions du Cerf, 1962

[5] Citado em Le Courrier de l’U.N.E.S.C.O., vol. VI, no. 10, October 1953

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